A APT aplaude o passo crucial dado pelo Congresso Nacional do Brasil para reforçar as salvaguardas de todas as pessoas presas, vedando o uso da videoconferência nas audiências de custódia. A decisão tomada pelo Congresso Nacional é o resultado de incansáveis esforços de advocacy por parte de inúmeras organizações da sociedade civil, incluindo a APT e seus parceiros, e defensorias públicas.
Tal proibição é essencial para garantir que as audiências de custódia sejam uma ferramenta efetiva para a prevenção e investigação de casos de tortura e abusos policiais.
Em 20 de abril de 2021, o Senado Federal votou pela derrubada do Veto Presidencial que havia obstruído essa proibição do uso de videoconferência.
"A decisão do Congresso Nacional de proibir a videoconferência nas audiências de custódia é fundamental para proteger a integridade física e psicológica de todas as pessoas sob custódia da polícia no Brasil", disse Sylvia Dias, Assessora Jurídica Sênior e Representante da APT no Brasil.
"Em um país onde a violência e a letalidade policial atingem índices alarmantes vitimizando desproporcionalmente a juventude negra do país, é crucial que o Estado implemente medidas para salvaguardar os direitos fundamentais das pessoas detidas e para monitorar a conduta policial".
Como a APT ressaltou em carta aberta enviada aos senadores e senadoras, as audiências de custódia são "um dos instrumentos mais eficazes para identificar e verificar indícios de tortura e outros maus-tratos nas primeiras horas após a detenção", que constitui o momento em que os detidos correm um maior risco de sofrer tortura ou violência. Contudo, para ser eficaz, é essencial que a pessoa custodiada compareça presencialmente perante uma autoridade judicial.
Na carta aberta, a APT manifestou a preocupação de que algumas audiências de custódia vêm sendo realizadas usando equipamento de vídeo instalado em delegacias ou unidades prisionais, e sem a presença física de advogado ou defensor ou defensora pública.
"Atesta-se asssim, a partir da observação de prática já em andamento, que com a adoção da videoconferência, as pessoas custodiadas prestam o seu relato em ambiente hostil, sem privacidade, podendo estar na presença de agentes de segurança estatais, inclusive rodeada por seus próprios algozes ", disse a APT, acrescentando que as audiências realizadas de tal forma torna " inviável a fiscalização por parte do magistrado de eventual intimidação ou coação que a pessoa custodiada possa estar sofrendo. ".
Com a chegada da pandemia da COVID-19 no Brasil, alguns tribunais no país começaram a realizar audiências - incluindo audiências de custódia - usando tecnologia de vídeo. Dados divulgados pelo Conselho Nacional de Justiça, demonstraram que com a suspensão das audiências de custódia presencial, houve uma diminuição de 83% nos relatos de tortura e maus-tratos na prisão, em comparação com os dados pré-pandêmicos.
Tal queda marcante destaca como a presença física da pessoa custodiada perante uma autoridade judicial é essencial para trazer à luz a violência policial, conforme destaca a APT em sua carta.
Desde a pandemia, a APT tem defendido, em estreita parceria com várias organizações da sociedade civil brasileira e defensorias públicas, que as audiências de custódia observem a exigência da presença física da pessoa custodiada perante um magistrado ou magistrada.
- Nós identificamos e promovemos boas práticas para encorajar audiências de custódia presenciais. Durante a pandemia, nove Tribunais de Justiça brasileiros estabeleceram protocolos de biossegurança que permitiram a retomada das audiências de custódia presenciais. A experiência em tais estados demonstrou que, mesmo durante uma grave crise de saúde pública, é possível conciliar o direito da pessoa sob custódia de ser levada perante um juiz ou juíza dentro de 24 horas após a prisão com a preservação da saúde de todos os envolvidos.Produzimos uma série de vídeos em três partes para mostrar os ajustes biosanitários feitos por esses tribunais estaduais para garantir que os espaços físicos e os procedimentos fossem eficazes na prevenção da COVID-19.
- Nós nos engajamos em diálogos com altas autoridades para promover audiências de custódia presenciais. No ano passado, a APT, em parceria com 4 entidades da sociedade civil e defensorias públicas, participou – numa iniciativa sem precedente - como amicus curiae de uma sessão plenária do Conselho Nacional de Justiça para argumentar contra a aprovação de resolução para permitir a realização de audiências de custódia no Brasil por videoconferência durante a pandemia da COVID-19.
- Unimos forças com as organizações nacionais da sociedade civil para mobilizar organismos internacionais, em particular a Comissão Interamericana de Direitos Humanos. Recentemente, nos juntamos a 66 organizações da sociedade civil para enviar um apelo urgente à Comissão Interamericana de Direitos Humanos levantando preocupações de que o uso da videoconferência restringe severamente a capacidade dos magistrados e magistradas para identificar se uma pessoa sofreu tortura ou violência durante a abordagem policial.
Continuamos reforçando os conhecimentos e habilidades dos juízes e juízas, mesmo em tempos de pandemia, na condução das audiências de custódia, em parceria com o Conselho Nacional de Justiça e tribunais estaduais.