Durante as manifestações populares que ocorreram nas principais capitais brasileiras desde junho de 2013, as respostas policiais foram, como é de costume no país, violentas e repressivas, resultando em diversos feridos e na prisão de centenas de pessoas.
En español: Mecanismos de monitoreo: un papel esencial en el contexto de la represión policial de las manifestaciones
Em meio à ação de diversos grupos de direitos humanos e advogados que oferecem apoio jurídico aos manifestantes, se destaca o trabalho do Mecanismo de Prevenção e Combate à Tortura do Rio de Janeiro, órgão estadual que cumpre as funções previstas no Protocolo Facultativo à Convenção das Nações Unidas contra a Tortura. Diante das mobilizações populares e protestos nas ruas, o Mecanismo concluiu que as prisões em grande número e a repressão à população precisavam ser acompanhadas de perto e demandavam sua rápida intervenção nos casos de manifestantes presos e criminalizados.
O Brasil vive um período inédito na sua história recente marcado por grandes manifestações populares nas ruas. O fenômeno tem permitido a aparição de insatisfações e injustiças na vida cotidiana, com exigências de maior participação democrática e transparência do poder público.
De fato, a insatisfação com problemas de natureza cotidiana não é algo recente e muito menos inventado no contexto brasileiro. Há algumas décadas os movimentos e mesmo as teorias sociais têm se preocupado com as condições da vida cotidiana, as injustiças que revelam e as expressões nítidas das relações de poder que tecem os cenários de problemas de moradia, gênero, políticas afirmativas étnico-raciais, acesso a serviços públicos, critérios de reconhecimento e inclusão etc.
No Brasil, os movimentos de moradia dos anos 1970/80 já delimitavam uma série de reivindicações sobre o espaço urbano, a experiência de vida que ele conforma e sobre a sua construção de uma maneira mais coletiva, transparente e digna. No início dos anos 90, a teoria política passou a agregar essa lógica de demandas por serviços e políticas urbanas inclusivas na pauta da administração pública, mas as respostas ao longo das duas últimas décadas não significaram necessariamente um aproveitamento mais democrático do espaço público no Brasil.
A gestão da vida social e a disputa pelas prioridades que a pautam são, portanto, um tema muito atual da política no Brasil e as manifestações que temos visto parecem ter evidenciado no nosso contexto, ainda que sem essa racionalização, que o locus do fazer político pode ser realocado para esses temas. A insatisfação com a política tradicional e o clamor pela invenção de novos modelos participativos para a democracia permeiam os protestos.
A prova de que essas ações populares não são irrelevantes e apolíticas são as respostas repressivas do poder público que estão sendo observadas. Dentre elas, o recrudescimento das atividades policiais, inclusive com a utilização da Lei de Organizações Criminosas (Lei 12.850) que autoriza medidas típicas de um estado policialesco e confere à polícia amplos poderes e arbítrio nas detenções. Como consequência, os abusos de autoridade e as violências cometidas são inúmeros e se multiplicam nas denúncias que podem ser acompanhadas pelas redes sociais e mídias alternativas.
A Ação do Mecanismo do Rio de Janeiro
Com o intuito de prevenir casos de maus tratos e tortura em contextos de privação de liberdade, o Mecanismo Estadual de Prevenção e Combate à Tortura no Rio de Janeiro tem acompanhado e procurado intervir dentro de suas competências nos casos de manifestantes presos e criminalizados.
Em conjunto com um grupo de advogados da OAB e diversas organizações não governamentais de direitos humanos, a preocupação do Mecanismo fluminense é acompanhar os casos dos manifestantes presos e intervir junto às autoridades para garantir que não receberão tratamento inadequado. Diante das circunstâncias de sua prisão, os manifestantes não costumam permanecer em custódia por muito tempo. Os membros do Mecanismo realizaram um acordo com a Secretaria Estadual de Administração Penitenciária do Rio de Janeiro (SEAP) para garantir que as pessoas detidas durante as manifestações não fossem enviadas à área de convívio dos presídios, ou seja, que ficassem em relativo isolamento com relação à população geral.
Esse acordo está em vigor desde o início das manifestações, em meados de 2013. Atualmente, os presos são detidos em Bangu até a sua liberação e no momento não resta nenhum manifestante preso. O acompanhamento realizado pelo Mecanismo do Rio de Janeiro prova que o envolvimento com a sociedade civil, e o engajamento em causas atuais e problemas iminentes fazem parte do escopo dos mecanismos de prevenção à tortura. Esse enfoque contribui para expandir o trabalho de prevenção da tortura diante de pautas urgentes da sociedade.
Os grandes eventos esportivos de 2013 e 2014
Em 2014, os protestos nas ruas provavelmente voltarão a se intensificar em diversas capitais do país com a realização da Copa do Mundo, já que as manifestações populares também têm como alvo os gastos milionários com os estádios e outras obras que servem para abrigar os eventos esportivos. Durante a Copa das Confederações, neste ano, ondas de protestos marcaram a insatisfação de muitos brasileiros com as escolhas autoritárias de orçamento e com os modelos econômicos em torno da decisão de sediar os eventos. Neste contexto, será de vital importância poder contar com a atuação da sociedade civil e dos mecanismos estaduais de prevenção à tortura - que esperamos que até lá já tenham sido implantados em outros Estados da Federação - no exercício democrático do controle social sobre os órgãos públicos de repressão.
Relatório Anual do Mecanismo de Prevenção e Combate à Tortura 2013
Luísa Luz de Souza é formada em Direito pela Universidade de São Paulo (USP) e atua com direitos humanos, com enfoque no sistema penitenciário e na defesa dos direitos das pessoas encarceradas. Entre junho e setembro de 2013, participou no programa de intercâmbio da Associação para a Prevenção da Tortura (APT), em seu escritório regional para a América Latina no Panamá. Para este programa de intercâmbio, foi a defensora de direitos humanos selecionada entre diversos candidatos do Brasil e Honduras, principalmente em razão de seu trabalho junto às mulheres privadas de liberdade no estado de São Paulo, Brasil, com a finalidade de promover ações com enfoque de gênero. Sua trajetória tem sido em organizações não governamentais, especialmente na coordenação de projetos. No terceiro setor, trabalha com pessoas e grupos em situação de vulnerabilidade, especialmente mulheres estrangeiras encarceradas e pessoas em situação de rua. Coordenou o Instituto Terra, Trabalho e Cidadania - ITTC e a Clínica de Direitos Humanos Luis Gama.
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Mecanismos de monitoreo: un papel esencial en el contexto de la represión policial de las manifestaciones
Durante las manifestaciones ciudadanas que han tenido lugar en las principales capitales brasileñas desde junio de 2013, las actuaciones policiales han sido violentas y represivas, como acostumbra a suceder en el país, y han tenido como resultado numerosos heridos y cientos de detenciones.
Entre las actividades de los distintos grupos en defensa de los derechos humanos y abogados y abogadas que ofrecen asistencia jurídica a los manifestantes, destaca el trabajo del Mecanismo de Prevención y Lucha contra la Tortura de Río de Janeiro, una entidad de ámbito estatal que cumple con las funciones previstas en el Protocolo Facultativo de la Convención de las Naciones Unidas contra la Tortura. Ante las movilizaciones populares y las protestas en las calles, el Mecanismo llegó a la conclusión de que era necesario seguir de cerca estas detenciones masivas y la represión contra el pueblo, además de una rápida intervención en los casos de detención y criminalización de manifestantes.
Brasil vive un periodo inédito en su historia reciente, marcado por grandes manifestaciones ciudadanas en las calles. Este fenómeno ha conducido a la expresión de la insatisfacción y la injusticia que la población experimenta en su vida cotidiana, con demandas de mayor participación democrática y transparencia del poder público.
De hecho, el descontento por los problemas de naturaleza cotidiana no es reciente ni mucho menos surgió en el contexto brasileño. Hace algunas décadas, los movimientos e incluso las teorías sociales se preocupaban por las condiciones de vida en el día a día, las injusticias que revelan y las expresiones nítidas de las relaciones de poder que dan lugar a los problemas de vivienda, género, políticas afirmativas de carácter étnico y racial, acceso a servicios públicos, criterios de reconocimiento e inclusión, etc.
Los movimientos por la vivienda en Brasil de los años setenta y ochenta ya establecieron una serie de reivindicaciones sobre el espacio urbano, la experiencia vital que este conforma y el deseo de reconstruirlo de manera más colectiva, transparente y digna. A principios de los años noventa, la teoría política comenzó a integrar esa lógica de demandas de servicios y políticas urbanas inclusivas en la agenda de la administración pública, pero las respuestas en las dos últimas décadas no han significado necesariamente un aprovechamiento más democrático del espacio público en el país.
La gestión de la vida social y la disputa por las prioridades que la regulan son, por tanto, un tema muy actual en la política brasileña y las protestas a las que hemos asistido parecen poner de manifiesto en nuestro contexto, aunque sin esa racionalización, que el foco de la formulación de políticas se puede reasignar a estos temas. El descontento con la política tradicional y el clamor por la invención de nuevos modelos de participación democrática impregnan las protestas.
La prueba de que estas acciones populares no son irrelevantes ni apolíticas queda patente en la respuesta represiva del poder público que hemos venido observando. Por ejemplo, el recrudecimiento de las acciones policiales, incluido el uso de la Ley de Organizaciones Criminales (Ley 12.850), que autoriza medidas típicas de un estado policial y concede a la policía amplios poderes y discrecionalidad en las detenciones. En consecuencia, los abusos de autoridad y los casos de violencia son innumerables y se multiplican en las denuncias recogidas en las redes sociales y en los medios de comunicación alternativos.
Actuación del Mecanismo de Río de Janeiro
Con el fin de prevenir casos de malos tratos y tortura en contextos de privación de libertad, el Mecanismo Estatal de Prevención y Lucha contra la Tortura de Río de Janeiro ha realizado un seguimiento de los casos de manifestantes detenidos y criminalizados y ha procurado intervenir en el ámbito de sus competencias.
Junto con un grupo de abogados del Colegio de Abogados de Brasil y diversas organizaciones no gubernamentales que trabajan en el ámbito de la defensa de los derechos humanos, la preocupación del Mecanismo de Río de Janeiro se centra en hacer seguimiento de los casos de manifestantes detenidos e interceder ante las autoridades para garantizar que no reciban un trato inapropiado. Dadas las circunstancias de su detención, los manifestantes no suelen permanecer detenidos mucho tiempo. Los miembros del Mecanismo llegaron a un acuerdo con la Secretaría Estatal de Administración Penitenciaria de Río de Janeiro (SEAP) para garantizar que las personas detenidas durante manifestaciones no fuesen enviadas a zonas comunes de las cárceles, es decir, que permaneciesen en un relativo aislamiento respecto a los demás internos.
Dicho acuerdo está vigente desde el inicio de las manifestaciones, a mediados de 2013. Actualmente, los presos permanecen recluidos en Bangú hasta su liberación y no hay en estos momentos ningún manifestante encarcelado. El seguimiento realizado por el Mecanismo de Río de Janeiro demuestra que el compromiso con la sociedad civil y la implicación en causas actuales y problemas inminentes forman parte del ámbito de actuación de los mecanismos de prevención de la tortura. Este enfoque contribuye a la expansión del trabajo para prevenir la tortura ante temas sociales urgentes.
Grandes acontecimientos deportivos en 2013 y 2014
Es probable que las protestas vuelvan a intensificarse en diversas capitales del país en 2014 con motivo de la Copa del Mundo, ya que las manifestaciones populares también tienen como objetivo el gasto millonario en estadios y otras infraestructuras que sirven para albergar eventos deportivos. Durante la Copa de las Confederaciones celebrada este año, olas de protestas reflejaron el descontento de muchos brasileños con las decisiones presupuestarias de las autoridades y con los modelos económicos que influyeron en la decisión de acoger los eventos. En este contexto, será de vital importancia poder contar con una respuesta de la sociedad civil y de los mecanismos estatales de prevención de la tortura - para entonces esperamos que ya se hayan implantado en otros estados federales - en el ejercicio democrático del control social sobre los órganos públicos de represión.